sábado, 11 de junho de 2011

DA HOMOSSEXUALIDADE À HETEROSSEXUALIDADE:


DA HOMOSSEXUALIDADE À HETEROSSEXUALIDADE:

Da Homossexualidade à Heterossexualidade: Há possibilidade de resgate da Heterossexualidade.


“E criou Deus o homem a sua imagem; a imagem de Deus o criou; macho e fêmea os criou.”
(Gênesis 1:27)


Por Rozangela Alves Justino (psicóloga – CRP 05/4917)


O presente relato constitui uma síntese de minha experiência profissional e compreensão da homossexualidade a partir do trabalho com o GA - Grupo de Amigos, observando, atuando e acompanhando o grupo no período de 1989 a 1994.


Iniciei o contato com o GA quando convidada a participar de uma jornada promovida pelo líder do grupo. As pessoas acometidas pelos desejos e/ou práticas homossexuais estavam em conflito com a vida que levavam: queriam encontrar uma resposta para a homossexualidade e seguir a orientação heterossexual, mas não sabiam como. Até então, eu só havia ouvido falar de pessoas que desejavam assumir a sua homossexualidade.


Procurei literaturas sobre o tema e passei a ouvir experiências semelhantes, bem como o relato de outras pessoas que já haviam mudado espontaneamente a sua orientação sexual de homo para hétero.


Sem focalizar o sintoma que o grupo apresentava (homossexualidade), procurei perceber as pessoas individualmente e estabelecer vínculos com elas. Verifiquei que muitos dos seus conflitos eram idênticos ao de outras pessoas, independente da orientação sexual.


Em pesquisas médicas, os cientistas ainda não conseguiram encontrar dados biológicos que determinem uma inclinação genética para a homossexualidade. Aliás, a conclusão que se chega é de que a natureza opera na reprodução e perpetuação da espécie.


Creio que os fatores emocionais e sociais, bem como os espirituais, têm grande influência na homossexualidade. Irei me deter aos aspectos emocionais e sociais.


Para o entendimento dos fatores emocionais tomei como base a linha psicodramática, que utiliza técnicas que facilitam o trabalho com grupos e levam a pessoa a agir diante do seu drama, encontrando respostas que apontam a uma saída adequada para sua situação.


J. L. Moreno, criador do Psicodrama, mostra-nos que qualquer aprendizagem só pode acontecer na relação do recém-nascido com a mãe e os outros “tus” e objetos ao longo da vida. Partindo deste princípio, Moreno associa o desenvolvimento emocional com o desempenho de papéis.


O papel é formado por marcas que ganham força e determinam o desempenho da pessoa numa situação específica a qual reage, estando também outras pessoas e objetos envolvidos. Desta forma, “o papel é levado a todas as dimensões da vida” (GONÇALVES, C. S., 1988, p.66).


Os papéis são complementares, ou seja, o meu papel de filho está em relação ao de pai ou de mãe com quem estou me relacionando. Podem ser o meu pai ou a minha mãe biológicos ou aqueles que paternalizam ou maternalizam na relação comigo. Só existe pai se houver filho, e só existe filho se houver pai.


A Matriz de Identidade foi o termo utilizado por Moreno para explicar o desenvolvimento emocional da criança, pois são das suas relações primeiras que ela irá herdar os modelos para suas relações futuras. Neste primeiro espaço a criança estabelecerá vínculos ao interagir com as pessoas e o ambiente ao seu redor. É, aí, na Matriz de Identidade, que ela recebe atenção, adquire valores morais e culturais e se prepara para participar da vida em sociedade.


Assim como todos os outros papéis, o papel sexual parece ter início na expectativa dos pais e entes queridos mais próximos, que já esperam o nascimento de um menino ou uma menina e projetam nele(a) todos os seus planos, antes mesmo de nascer.


Espera-se que a criança desempenhe o papel que a família escolheu, o que está diretamente ligado ao sexo que irá ter: masculino ou feminino. Muitas famílias esperam por uma criança de determinado sexo e, quando isto não ocorre, se frustram. Pode também nascer o menino desejado pela família, no entanto a expectativa familiar é de que ele tome conta da mãe, protegendo-a ou suprindo-a da falta do pai, por omissão deste ou até mesmo pelo fato de ser agressivo. A lei da casa passa a ser: “Tome conta da sua mãe até que ela morra, você não tem o direito de ter outra mulher em sua vida, a sua mãe irá bastá-lo!”. O menino poderá ser também “a companheira” da mãe: “Tão bom seria se meu filho fosse uma menina, as mulheres são mais companheiras das mães!”.


Tais impressões, verbalizadas ou não, sempre são incorporadas pelo menino através da maneira pela qual a família se relaciona com ele. É muito difícil para os filhos não atenderem ao apelo dos seus entes queridos. O seu “eu” vai se estruturando a partir das marcas que são passadas para o seu registro corporal, bem como as impressões de aceitação ou não da sua pessoa, do seu jeito de ser e do seu sexo biológico. É muito comum a família ver o filho adotando papéis homossexuais e “não perceber”. Há uma cumplicidade velada entre as partes. O papel é complementado. É claro que ambas as partes são responsáveis pela sua situação - se o filho não quiser ele não complementa este papel.


Quando a estes registros se juntam os mitos que dominam a sexualidade e influenciam a conduta das pessoas e as experiências sexuais perversas (por exemplo, abusos sexuais na infância), acaba sendo favorecido o desenvolvimento do papel homossexual.


Os mitos são interpretações folclóricas da realidade e estes se tornam mais fortes ou mais fracos segundo as confirmações da realidade. Inserem-se no espaço que o conhecimento deixa vazio. Um grupo que se propõe a trabalhar com os que desejam deixar a homossexualidade precisa ser educativo, pois as informações desfazem os mitos que influenciam a sexualidade. Os mitos existem quando encontram quem os complemente - se não há quem acredite no mito ou se ambas as pessoas não o compartilham, ele morre.


Não são poucos os meninos que escutam que o “pinto” vai cair quando são pegos bulindo-o. Quando se tocam os outros dizem que podem se tornar maricas, falar fino. Escutam ainda que homem que é homem não chora, que quem brinca com boneca é menina.


A verdade é que as crianças crescem com estas impressões que geram muitas dúvidas, inseguranças e conflitos que interferem na formação da sua identidade psicossexual, principalmente para aquelas que saem do padrão masculino ou feminino estabelecido pela cultura em que vivem.


É claro que os pais precisam vestir os seus filhos de forma a ajudá-los na adequação aos papéis sociais já determinados pelo seu sexo biológico, o que precisa ocorrer de forma natural e tranqüila. Normalmente, quando o pai tem uma boa aceitação do seu sexo biológico, valorizando o filho no seu papel masculino ou feminino (sexo em que nasceu), a orientação sexual da criança seguirá o curso de seu sexo biológico, naturalmente.


Na verdade, a própria vivência sexual dos pais e a falta da resolução adequada de seus conflitos pessoais poderá influenciar o filho. Muitos são os pais e pessoas ligadas afetivamente à criança que afirmam que “homem não presta, que não são confiáveis, que homens são todos iguais” - estas mesmas afirmações podem se referir também às mulheres. Um filho que sempre ouve isto dos seus familiares acaba acreditando e, sem conseguir discriminar o que “presta” ou não, a generalização poderá servir de crivo para todas as pessoas que encontra pela frente. Quando tais relatos são confirmados na realidade de algumas de suas experiências, tomam um vulto maior.


Todas estas vivências influenciam a formação da identidade psicossexual da criança, criando-lhe confusão. Qual é o menino que vai querer ser homem se ouve que os homens não prestam, que só fazem mal para as mulheres? E se esta mulher for a sua mãe? Normalmente, ninguém vai querer ser visto como um “homem mau”, “alguém sem valor”.


Reconhecemos ainda que os papéis sociais do masculino e do feminino sofreram grandes mudanças nos últimos anos. Há pouco tempo víamos uma definição mais clara de “ser homem e ser mulher”. É certo que os padrões estabelecidos para estes papéis eram muito rígidos e se um rapaz não se enquadrasse no modelo social masculino era severamente desclassificado com relação ao seu papel sexual. Hoje em dia, há uma maior flexibilidade, porém acompanhada de indefinição do que seriam o papel masculino e o feminino. Como cita Sérgio Perazzo (1986), os papéis de homem e de mulher refletem sempre a existência de uma dinâmica social, individual e política, exigindo uma permanente formulação e um novo posicionamento. Pergunto: Já que há possibilidade de reformulação dos papéis masculino e feminino, por que não poderá haver mudança de homo para hétero?


L. Cuschinir, em seus estudos dos “grupos de gênero” declara que o homem está em crise de identidade, pois todos os modelos de relacionamento não estão mais servindo e isto influencia o desenvolvimento emocional e psicológico do homem e da mulher. Surge a pergunta: O que é ser homem? O que é ser mulher nos dias de hoje? A verdade é que “os homens de hoje ainda têm que provar a toda hora para si mesmos, para as mulheres e para outros homens que ele é muito homem” (CUSCHINIR, L. 1992, p. 17).


O feminismo gerou um grande movimento no mundo das mulheres, mas os homens não conseguiram acompanhar as mudanças e se encontram perdidos no seu papel masculino. As mulheres também se encontram insatisfeitas e isto repercute diretamente no seu papel sexual.


Pessoas que vivenciam a homossexualidade/heterossexualidade apresentam conflitos nos dias atuais. O que “está” homossexual tem preferência afetiva por pessoas do mesmo sexo, podendo ser seguida de prática sexual ou não. O heterossexual prefere o sexo oposto, porém não sabe mais estabelecer relação com este. Os encontros são desejados, mas os desencontros são freqüentes.


Uma vez que os papéis sociais, masculino e feminino, estejam em crise, conseqüentemente o papel sexual também estará. Quando aquele que está em conflito com o seu papel sexual já passou por experiência de abuso sexual na infância, teve uma maior identificação com a mãe ou figuras femininas da casa (comprometido por uma estrutura de ego frágil), além da figura omissa ou agressiva do pai, há fortes tendências para a instalação da homossexualidade.


A preferência afetiva por pessoas do mesmo sexo é uma forma de pegar para si traços, qualidades, ou seja, aquilo que ficou faltando para a formação da sua identidade psicossexual.


É muito comum existirem, entre as pessoas que apresentam orientação homossexual, vítimas de alguma forma de abuso sexual na infância em que o autor do abuso tenha sido alguém ligado afetivamente à criança. Esta experiência distorce a personalidade de quem foi abusado, criando marcas difíceis de serem superadas. A criança não tem maturidade física e nem emocional para suportar as emoções de uma relação sexual ou qualquer estimulação desta natureza.


Este conjunto de vivências com suas marcas e impressões influenciam tanto o desenvolvimento emocional do ser humano quanto o seu papel sexual. No caso do homem que “está” homossexual, tais marcas criam dúvidas com relação a sua masculinidade. O que fazer, então? Como ajudar estas pessoas?


A psicoterapia individual e/ou em grupo é importante para aquele que deseja resgatar a sua heterossexualidade, incluindo os grupos de apoio e mútua-ajuda. A psicoterapia psicodramática em grupo deixa a sua contribuição neste processo. No decorrer do trabalho a pessoa vai podendo reconhecer o seu eu, diferenciando-se do tu, podendo favorecer a sua reestruturação e contato com os seus aspectos masculinos ou femininos, conforme o seu sexo biológico. A percepção de que a sua condição não é única, que outras pessoas também passam por situações semelhantes, faz com que saia do centro do universo, que veja o outro e amadureça.


No trabalho com pessoas que vivenciam a homossexualidade é preciso usar técnicas que facilitem o reconhecimento do eu e do tu, permitindo a sua diferenciação. Muitos não conseguem se reconhecerem como homens nem como mulheres, segundo o seu papel biológico. A maioria chega ao grupo indiferenciada. Nem sempre o crescimento emocional acompanha o fisiológico, sendo a imaturidade emocional uma característica marcante entre os que “estão” homossexuais. Eles podem até desempenhar normalmente seus papéis profissionais, mas no que se refere ao papel sexual só conseguem se relacionar com o igual por terem se fixado em fases remotas da infância.


Nos casos observados, percebe-se que um dos motivos que levam um rapaz a se relacionar com outro é a procura de si mesmo - numa tentativa de responder à pergunta: Quem sou eu? É como se quisesse imprimir em si toda a masculinidade do outro com as relações homossexuais, além da proteção, da segurança, do carinho e da atenção que necessita da figura masculina - só que as experiências homossexuais não suprem as suas faltas, muito pelo contrário, podem viciar e se tornarem uma compulsão.


À medida que o reconhecimento do eu vai sendo alcançado, bem como o reconhecimento do tu, a diferenciação do eu e do tu vai ficando cada vez mais marcante. O processo de maturidade vai sendo efetivado e a possibilidade da interação homem/mulher (eu diferente do tu) se torna possível.


As marcas ou rótulos do passado vão sendo superados à medida que as “máscaras” forem caindo, ou seja, forem ficando mais claros para a pessoa os motivos que fizeram com que o papel homossexual se cristalizasse. O rótulo “gay” ou “homossexual” mascara a realidade e impede a pessoa de ser vista internamente.


As pessoas chegam ao GA confusas e envolvidas pelo “rótulo de homossexuais”, acreditando que realmente são o que o rótulo representa; não conseguem ter uma percepção clara da sua realidade interior.


As técnicas psicodramáticas levam à transformação. As mudanças vão sendo percebidas quando as máscaras vão desaparecendo e a pessoa vai podendo ser ela mesma, criada à imagem e semelhança de Deus, homem e mulher. Um grupo terapêutico poderá ajudar a pessoa a retirar o rótulo “homossexual” e as máscaras também não terão razão de existir.


Moreno coloca o papel como forma de funcionamento de uma pessoa com relação à outra. Sendo assim, os papéis podem mudar e o resgate da heterossexualidade fica possível. Não de forma mágica, mas num processo em que a pessoa vai reconhecendo em si, a cada dia, os seus aspectos heterossexuais.


Naffah Neto (1979, p.199) afirma que “é o indivíduo espontâneo-criativo capaz de retornar aos Papéis Sociais cristalizados e fixos que circunscrever e recriá-los na vivência das próprias relações em que se vê lançado”.


O resgate da heterossexualidade é possível no convívio com um grupo em que aquele que está vivenciando a homossexualidade é aceito e respeitado, podendo confiar suas intimidades sem o risco de chacotas, sem ser exposto e sem que as suas confidências sejam usadas para acusação ou agressão mais tarde. A pessoa precisa de um espaço confiável e respeitoso. É importante também o convívio com aqueles que já experimentaram a mudança de homo para hétero, isto é, deixaram a homossexualidade e desenvolveram a heterossexualidade, bem como com heterossexuais que possam abraçá-lo e aceitá-lo, numa descoberta de que é possível um homem ser afetivo com outro sem que exista atração sexual entre eles.


Um grupo terapêutico com pessoas de ambos os sexos ajuda aquele que “está” homossexual a reconstruir as suas relações. A percepção adequada do eu, do tu, do ele e do nós o ajuda a reconstruir o seu papel sexual, facilitando o despertar da sua inclinação afetiva para o sexo oposto e, conseqüentemente, o desejo (atração, orientação) sexual, também.


Da mesma forma que a aprendizagem dos papéis que levam à homossexualidade acontece através dos vínculos estabelecidos nas relações com os tus e objetos ao longo da vida do indivíduo, o papel heterossexual poderá ser desenvolvido na relação com os tus e objetos que ajudarão o indivíduo a desenvolver este novo papel. Podemos chamar novos tus e objetos de grupo terapêutico ou de grupo de ajuda mútua.


Assim, tanto os apoiados do GA e demais instituições de apoio como muitos dos que comparecem aos nossos consultórios vêm com uma máscara de homossexual, procuram o terapeuta para que sejam ajudados a retirá-la e pedem para serem confirmados como heterossexuais. No fundo sabem que a sua inclinação (orientação) é heterossexual, mas por alguns motivos desempenham o papel homossexual.


Sempre cabe a lembrança da afirmação de Sérgio Perazzo (1986, p.99):
“É anular a existência pensar em papel desenvolvido no sentido de acabado. Os papéis ligados à sexualidade, como qualquer papel, sempre poderão se desenvolver.”


Referências Bibliográficas:
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Naffah Neto, A. - Psicodrama - Descolonizando o Imaginário. São Paulo, Brasiliense, 1979.
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Perazzo, S. - Descansem em Paz os Nossos Mortos Dentro de Mim. São Paulo, Francisco Alves, 1986.
Soeiro, A. C. - Psicodrama e Psicoterapia. São Paulo, Natura, 1976.


OBS. Este artigo foi publicado no Boletim de Psicoteologia do CPPC-Corpo de Psicólogos e Psiquiatras Cristãos, Ano IX, nº, 2º Semestre de 1996. Revisto em julho de de 2006.

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